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segunda-feira, 18 de julho de 2011

A Carta

São Paulo, 11 de outubro de 2011.

Começo dizendo que essa carta você nunca irá ler. Nunca irá, porque nunca a enviarei. Irei imprimir e a princípio, guardarei na gaveta do meu criado mudo. Depois irá para a caixinha junto com todas as outras que não enviei, apenas escrevi.
Escrevi sobre o que aconteceu comigo depois que você foi embora. Depois que partiu naquele navio rumo a Europa, sem olhar para trás, sem pensar no coração que deixou no Brasil. Não digo que está errada, de maneira nenhuma. Você está certíssima, afinal, por que ficar sofrendo por amor?
Escrevi nessas cartas empoeiradas, os meus sonhos. Invenções sobre a nossa suposta vida juntos. Nele nós nos reecontraríamos dali 15 ou 20 anos.  Casados ou não, com filhos ou não, felizes ou não. E ficaríamos frente a frente, sentindo aquela mesma emoção de anos atrás. O mesmo gelo, as mesmas borboletas, o mesmo sorriso.
E então... e então cometeríamos uma loucura! Faríamos planos para fugirmos juntos, para outro estado, talvez para outro país. Deixaríamos nossos filhos com nossos companheiros e não iríamos pensar no futuro, nas consequências.
Estaríamos tão felizes neste dia, com a adrelina a flor da pele, ansiaríamos com a presença um do outro, porque somente isto já bastaria para sermos felizes para sempre.
Faríamos planos de construirmos uma casa de campo simples mas aconchegante. Toda branca, janela azul, com a bandeira dos Estados Unidos hasteada no quintal. E por falar em quintal, no sonho, eu estou lavando o nosso carro, você cuidando das plantinhas e ao mesmo tempo brigando com o Babalu, nosso lindo labrador caramelho, porque ele destruíra as suas violetas.
Depois iríamos para o parque fazer um piquinique e jogar disco para o Babalu. Ficaríamos lá a tarde toda e só iríamos embora quando o sol decidisse dormir e dar lugar a lua.
E então voltaríamos para casa e você iria preparar o jantar. Prepararia meu prato favorito: carne ensopada ao molho madeira com batata sotê. Comeríamos muito, e você ficaria muito feliz por eu estar   raspando o prato de tão gostoso que ficara. Babalu estaria na ponta da mesa com um olhar pidão, querendo provar suas batatas também.
Depois assistiríamos a um filme e acabaríamos dormindo no finalzinho, abraçados um ao outro e só daríamos conta que dormimos no sofá de madrugada.

Mas tudo isso que escrevo é mera ilusão. Somente um sonho tardio, sem chances de acontecer. Porque você não voltara da Europa. Casou-se com um magnata, dono de uma industria de metal.
Pelo que parece, você se dedicou a sua vida familiar e teve três filhos: uma moçoila e dois rapaizinhos. É, eu vi pelas fotos. Agora já estão grandinhos. Grandinhos não, grandões. A moça está noiva e os meninos na faculdade, não é isso? E seu marido...bem seu marido perdera bastante cabelo nesses últimos anos. Percebi pelas fotos também. Já você continua bela. Me arrisco a dizer que está mais bela que há 43 anos, quando te vi pela última vez.
Você deve estar se perguntando, ou não, afinal não está lendo essa carta que redigo pelo word, como sei de tudo isso não é mesmo?
Bom a história não é lá muito longa. Estou divorciado de uma mulher que nunca amei. Tive uma filha e somente uma, porque minha ex nao queria estragar seu maravilhoso corpo com outra gravidez. Não adiantou muito, porque os doces e as frituras cuidaram dessa parte. Essa filha, agora está muito bem casada e me dera dois netinhos lindos.
Epa, estou fugindo da história. Você quer saber como estou tão bem informado sobre a sua vida não é mesmo?
Pois bem, minha filha estava me achando muito amuado depois que me divorciei. Não saia muito de casa, só ficava trancado no quarto assistindo novelas, Topa ou não Topa e Two and half man.
Ela então decidiu me inscrever no Facebook. Segundo ela, um site de relacionamentos que iria me ajudar a encontrar velhos amigos e conhecidos. Mas não é que deu certo? O site sugeriu você como uma amiga em comum. Cliquei no seu perfil e lá estava a sua vida. Viagens a Israel, Egito, Miami, Japão, França e veio até para o Brasil, Porto de Galinhas. Vi o aniversário de 21 anos do seu filho, o noivado de sua filha (e cá entre nós que noivinho feio hein?!), a sua segunda lua de mel (arggggh) e a premiação que recebeu por cinquenta mil livros vendidos. Confesso que isso me surpreendeu. Quem diria....escritora? E notei que assina os livros com o nome de casada.
Agora, cá estou. Um homem de sessenta anos, longe do peso ideal, calvo (mas não tanto quanto seu marido), na frente do notebook, aflito com a seguinte dúvida: Envio ou não uma "Solicitação de Amizade" para você?


5 comentários:

  1. Fê, que lindo isso! *---*
    Nossa, parabéns!

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  2. Adorei Fê!
    Parabééns =)
    Mas se eu fosse ele não enviava não viu? haha

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  3. é bom ele enviar e essa história continuar! RUM! hhaeuisheushui...

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  4. Oh coitado!!!
    Fiquei com mais dó dele até duq a menina Bozo!
    hauhauhauahua
    sefufu
    parabéns pelo texto!
    adoro a informalidade de seus textos

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